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“E NÃO ESQUEÇAM, VOCÊS DEVEM TER ESTUDADO HISTÓRIA”: A FALA DO PROCURADOR PARAENSE, OS DISCURSOS E OS OLHARES A PARTIR DE ANTIGAS NARRATIVAS NAS TRADIÇÕES ESCOLARES

Texto de:

*ATHOS MATHEUS DA SILVA GUIMARÃES


Introdução

A escola é um espaço permeável das tradições da sociedade que a rodeia, influenciando diretamente nos processos de construção e seleção nos métodos de debates sobre conteúdos que serão diariamente expostos para as/os discentes durante o ano letivo. Dificilmente a escola não possuirá influência dos diversos grupos ao seu redor, obviamente uns mais que outros, uma vez que a escola é produto da própria sociedade e não há como apartar uma da outra.

É possível ver esses processos diariamente no espaço escolar, quem está cotidianamente na escola percebe essas influencias. Docentes, Coordenação e discentes estão a todo o momento recebendo influencias dos diversos grupos presentes na população. Os debates postos no espaço escolar, apesar de serem selecionados pelos docentes com presença da coordenação, têm vontades de determinados grupos, seja com objetivos sociais, políticos, religiosos, culturais e econômicos. Ou simplesmente a junção de todos estes aspectos. Pois os diversos grupos veem a necessidade de enxergar a construção de suas características em todos os espaços, especialmente no espaço escolar, local por excelência para a naturalização de características dos próprios grupos.

Desta maneira, a escola é local por excelência para a construção de aparatos de discussões para as mais variadas características da sociedade. Mas o desenvolvimento destes debates tem os olhos atentos dos diversos grupos presentes na sociedade, pois a possibilidade de dar continuidade as características e dão sentido as tradições dos grupos ao redor da própria escola, os discentes são pertencentes destas comunidades e neles são depositadas as expectativas de dar continuidade aos padrões da sociedade.

No mesmo ritmo que a escola recebe influencias da sociedade para a continuidade das tradições, da mesma maneira o espaço escolar consegue construir tradições que são introduzidas na própria sociedade. Obviamente oriundas dos objetivos postos por grupos que conseguem por seus interesses no espaço escolar, sendo consolidadas para os restantes da população. As tradições escolares possuem diversas ramificações em suas características, fabricadas ao longo do processo de atividades escolares em diversas regiões, como no Brasil. As tradições escolares são tão fortes quanto as tradições que os diversos grupos presentes na sociedade, pois é algo naturalizado, em outras palavras, são debates ensinados ao ponto de estar sempre dentro dos roteiros esperados pela população. Uma vez fora do roteiro, é estranhado e reprimido.

As narrativas escolares, frutos das tradições escolares, estão presentes no cotidiano das pessoas, sendo reproduzidas cotidianamente, tendo estas informações como respaldo a partir dos debates que foram construídos há anos no espaço escolar. Narrativas que podem favorecer debates para a construção de uma sociedade mais diversificada, ou a continuidade de visões pejorativas sobre outros grupos na sociedade. Mas as tradições escolares têm narrativas que mais dão continuidade a visões pejorativas do que possibilitam margens para debates mais diversificados.

Este breve texto tem como objetivo tecer algumas considerações sobre as tradições escolares e as narrativas que são proferidas pela sociedade sobre os outros grupos presentes na mesma sociedade, em especial as sociedades indígenas e negras. Da mesma forma que terá breves comentários sobre os aspectos que tais comentários são desenvolvidos e os objetivos inseridos nestes discursos.

1. Olhar e as narrativas “ensinadas”

Na última terça-feira do mês de novembro, 26, o procurador de justiça e ouvidor geral do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), Ricardo Albuquerque, realizou uma palestra para discentes de uma faculdade particular no município de Belém. Em parte de sua comunicação aos discentes, o desembargador começou a pronunciar suas perspectivas sobre as sociedades indígenas, africanas e afro-brasileiras. Como também sobre a escravidão no Brasil. Ele começou a “explicar” o processor de tráfico e da introdução da mão de obra africana escravizada no Brasil colonial. Na fala do comunicador, é atribuído a presença da mão de obra africana escravizada pelo fato “dos indígenas não gostarem de trabalhar”, “não terem o interesse de trabalhar para os portugueses”, por isso a introdução de escravizados na colônia portuguesa na América.

A fala do desembargador atribui a introdução da mão de obra escravizada no Brasil as sociedades indígenas que eram, em suas palavras, “preguiçosos” e índio preferia morrer do que cavar mina, do que plantar pros portugueses. Construindo a ideia aos discentes presentes de que as sociedades indígenas eram preguiçosas, não gostavam de trabalhar. Esta ideia esvazia todo o debate sobre as sociedades indígenas e acaba construindo uma imagem totalmente negativa sobre as sociedades indígenas.

Além disto, na fala do palestrante os indígenas foram responsáveis pela introdução de escravizados vindo da África. Constrói a ideia de que o processo de escravidão no Brasil colonial foi responsabilidade da “preguiça” dos indígenas. Tendo os portugueses com a vontade de explorar a região, e na concepção do procurador: Foi por causa disso que eles foram buscar pessoas nas tribos na África, para vir substituir a mão de obra do índio.” Dando a entender ao público que o sofrimento de um foi consequência dos atos das sociedades indígenas.

A comunicação proferida pelo procurador de justiça dá a continuidade de olhares pejorativos sob as sociedades indígenas que já carregam a estigma de grupos ociosos ou somente pertencentes a floresta, sem poder sair destes limites. Da mesma maneira que recai sob eles a noção de que a escravidão de africanos no Brasil foi “graças” ao seu desinteresse em realizar os trabalhos que os portugueses exigiam. Assim retirando a responsabilidade da coroa portuguesa e dos colonos no processo de captura, transporte e imposição do trabalho forçado. O personagem colonizador é retirado de cena no que tange o processo de introdução da escravização do território colonial.

O conteúdo proferido pelo desembargador dá continuidade, ou reforça, velhas narrativas presentes na sociedade brasileira. Narrativas que são construídas em âmbito já dentro do tradicional no que interessa a construção de características para os diversos personagens que compõem a história do Brasil, em especial sobre as sociedades indígenas, africanas e afro-brasileiras. Como também sobre a escravidão, tema que ainda é extremamente sensível para os diversos grupos presentes na sociedade brasileira. Mas de qualquer forma, a fala do procurador não é um ato isolado e novo, é algo que está encrustado na sociedade brasileira, principalmente pelo fato de muito ter sido ensinada nas escolas de ensino básico brasileiro.

2. Os papeis dos personagens ensinados

Quando tratamos sobre o espaço escolar nos vem diversas perspectivas sobre tal assunto, várias pessoas pensando na melhor metodologia para conceber e desenvolver suas atividades cotidianas para servir de melhor maneira todos os discentes. Praticamente boa parte da sociedade acredita que a escola é o melhor caminho para a construção de uma sociedade avançada, passando pelos debates no espaço escolar a construção de uma sociedade ideal. É a busca desta “sociedade ideal” que começam os conflitos sobre a melhor maneira de desenvolver e aplicar os debates em sala.

A trama é construída e debatida, os personagens são pensados, produzidos e distribuídos. As cenas são minuciosamente arquitetadas para conseguir atrair e fixar os olhares da plateia na peça que vai desenrolando “diante de seus olhos”. As narrativas são pensadas cuidadosamente para fazer com que o público, exigente e ansioso, possa acreditar que aquilo é real, aconteceu ou está acontecendo de “verdade”. Assim, a partir do momento da crença, começa a espalhar e convencer os demais do que “viu” e “ouviu” no espetáculo.

De certa maneira a escola e o ensino de história tornam-se semelhantes, porém com a diferença que existem diversas narrativas ansiosas para emergirem neste palco do espaço escolar, na esperança de conseguirem estar dentro dos debates em sala de aula. Toda via, ainda é forte as tradições construídas no espaço escolar, especialmente as narrativas construídas no ensino de história.

Algumas delas está ligado as sociedades indígenas, africanas e afro-brasileiras. Em especial velhas características pejorativas sobre estes grupos. Voltando a fala do procurador, antes dele tecer os comentários sobre tais grupos, ele começou falando sobre a história. Não discorrendo sobre debates sobre História, mas como justificativa para o que ele vinha falar posteriormente. Inicialmente ele fala: “Vocês devem ter estudado História” e logo em seguida começa a falar “que só houve escravidão porque os Índios não gostam de trabalhar”.

A fala do desembargador não é algo novo na sociedade brasileira. Este olhar sobre as sociedades indígenas é algo que foi ensinado, e ainda é, durante muitos anos em diversas escolas básicas brasileiras. Quando se questiona pessoas que estudaram em escolas de ensino básico no século XX sobre o processo de introdução da escravidão no Brasil fatalmente identificará respostas como “índio não gostava de trabalhar”, “O índio não estava acostumado com o trabalho escravo e por isso trouxeram negros”, “porque índio é preguiçoso”, “o negro estava acostumado com o trabalho na lavoura” e dentre outras respostas.

O autor Nicholas Davis ao analisar a construção das camadas populares nos livros didáticos percebe narrativas que se tornam tradicionais nos livros didáticos. Os livros didáticos tem uma grande influência na construção dos debates e, principalmente, na seleção dos debates que irão compor estas aulas. Desta forma, as narrativas que estão presentes nos livros didáticos, possivelmente, estará nas narrativas dos docentes. Sobre a introdução da mão de obra escravizada africana, Davis apresenta uma das explicações que foram bastante utilizadas na escola e são utilizadas por parte das sociedades. Segundo o autor:

A inadaptabilidade do índio e a adaptabilidade do negro ao trabalho agrícola e sedentário é outra explicação comum nos livros didáticos para a introdução da escravidão negra no Brasil (DAVIS, 2014, p. 130)

As narrativas sobre estes grupos são, em sua maioria, de cunho pejorativo. Uma maneira de desqualificar tais grupos diante da sociedade como um todo. O ensino de história desempenhou um grande papel neste processo, a de consolidar tais discursos sobre estas sociedades. Obviamente temos que levar em consideração que a maneira como um grupo é narrado dependerá de quem está no controle desta narrativa e o posicionamento de tal sobre os demais. Acontece da mesma maneira com a escola e o ensino de história, as narrativas que estão presentes no espaço escolar são resultadas da imposição de grupos para ser posto o discurso de seu interesse nas aulas, da mesma maneira que combate outras narrativas que tente submergir neste espaço tão disputado. A escola é local que dará a sociedade subsídios para a construção de suas identidades, tanto individual como, e mais significativa, coletiva.

2.1. A construção das narrativas, construção dos personagens

As sociedades indígenas, africanas e afrodescendentes são introduzidas em perspectivas construídas de forma pejorativa aos olhos da sociedade. Como grupos pertencentes a fatos bastante específicos na história, não podendo transcender além desta perspectiva. Da chegada dos portugueses, as primeiras atividades extrativistas na região, período de substituição da mão de obra, sobre a escravidão, rebeliões e o período de abolição.

No que tange a fala do procurador, ele tocou na perspectiva sobre o processo de introdução da mão de obra escravizada africana no Brasil. Sendo introduzida toda a responsabilidade sob as sociedades indígenas neste processo de “troca” e de introdução de mão de obra. Esta fala encaixa-se na maneira tradicional e nas leituras consagradas sobre estes grupos.

Como afirmado anteriormente, existem diversas respostas para este processo. Resposta não dos especialistas sobre a temática, mas respostas da sociedade como um todo que passou décadas aprendendo que a substituição da mão de obra escravizada foi pelo fato dos índios “não estarem acostumados com o trabalho escravo” e as “sociedades africanas estarem mais aptas ao serviço”. É importante observar que estas visões pejorativas foram ensinadas no espaço escolar. Neste processo vai demorar muito tempo para colocar para a sociedade ser ensinada, também, a introduzir em suas falas a responsabilidade no colonizador sobre o processo de tráfico, mas de qualquer forma ainda é sólido a leitura sobre este processo.

Dá mesma forma que tal momento foi exposto aos discentes como algo “natural”, sem a resistência de ambos os grupos. Como se fosse predestinado a ambas comunidades no que tange servir como escravizado neste processo de escravidão. Os processos sempre são expostos como algo sem resistência, sem uma insatisfação contundente perante ao momento de substituição da mão de obra. Tanto por parte das sociedades indígenas quanto pelos grupos africanos e afro-brasileiros.

Isso já faz parte de um processo ainda maior sobre tais grupos, dá mesma maneira que o seu papel na sociedade brasileira. A construção de uma nação para o Brasil perpassa fundamentalmente pelo princípio da união de todos os grupos presentes na sociedade brasileira para o desenvolvimento da mesma. É a construção de uma harmonia entre os diversos grupos, principalmente entre Sociedades indígenas, africanos, afro-brasileiros e portugueses, para a construção das características para sociedade brasileira hoje. É por isso que não pode existir conflitos entre estes grupos, não pode ocorrer disputas entre estes personagens, pois a formação da nação depende de uma harmonia entre ambos os grupos. Desta maneira, as leituras construídas sobre específicos períodos da história do Brasil são contadas como algo mais amenizado, como por exemplo sobre a escravidão.

Jaime Pinsky realiza uma análise sobre a construção da nação, da consciência nacional e da mesma forma desenvolve leituras sobre as narrativas construídas para atingir o objetivo de construir tal nação. A nação brasileira teve como espectro a necessidade de não haver conflitos entre os diversos grupos presentes. É como ele afirma: “esse é outro valor que aparece em nossos livros de História: a ideia de um Brasil sem preconceito racial, onde cada um colabora com aquilo que tem para a felicidade geral” (PINSKY, 2014, p. 19). A ideia da sempre harmonia entre os grupos, tendo a tentativa de obscurecer os conflitos existentes e reprimir quem tente desmascarar as disputas.

Uma das principais visões que se possui sobre a escravidão no Brasil foi a metodologia que foi utilizada para ter este tipo de sistema. Criou-se a ideia de que foi amena, diferente do que ocorreu em países anglo-saxões. A escravidão no Brasil foi caracterizada como amena diante das formas como foram tratadas em países como os Estados Unidos da América. Negando toda a violência existente no processo de escravidão no Brasil, abdicando totalmente da ideia de ter existido conflitos neste processo.

Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, Jair Bolsonaro, então candidato à presidência da República, proferiu palavras sobre isso. Inicialmente tratou o assunto como escravidão de uma maneira diferente, inicialmente afirmou que foram os grupos africanos que desejaram adentrar nas embarcações dos portugueses. Na ideia dele negando a violência neste processo, uma vez que foi consentido o momento de tráfico. O segundo ponto suscitado por ele foi sobre as cotas, na concepção dele é injusto, uma vez que ele “não escravizou ninguém”, então não tem de sanar dívida. Este trecho final é semelhante ao que foi dito pelo procurador, ao dizer que: Nenhum de nós aqui tem navio negreiro. Nenhum de nós aqui, se você for ver sua família há 200 anos atrás (sic), tenho certeza que nenhum de nós trouxe um navio cheio de pessoas da África para ser escravizadas aqui.”

Esta concepção sobre o processo de escravidão e sobre “dívida histórica” é vista como algo desnecessário aos olhos destes grupos, uma vez que não existiu violência no processo de escravidão ou simplesmente porquê não teve ninguém em sua família que praticou tráfico ou mandou trazer. As visões são deturpadas, mas são originadas de um local especifico. O ensino de história por muito tempo reproduziu a ideia de processos sem conflitos, ou simplesmente sem conflitos contundentes. Que foram tudo resolvido dentro da perspectiva do diálogo, no constante objetivo de criar a noção de uma harmonia entre ambos os grupos.

O discurso de que a escravidão não tão violenta como foi colocada, a noção de uma harmonia entre ambos os grupos, a inexistência de racismo no Brasil teve como base o trabalho de Gilberto Freyre, Casa grande e senzala. Esta obra foi utilizada, e de certa maneira ainda é utilizada, para a construção da noção de uma escravidão amena, sem tantos conflitos entre ambos os grupos.

A obra de Gilberto Freyre foi construída no início do Século XX, com concepções do período que o motivou a construção da tese do autor, que não vamos nos debruçar neste texto, e da mesma forma que o local social, político e cultural de Gilberto Freyre influenciaram no processo da produção da obra. Desde a construção de Casa grande e Senzala, diversas outras obras foram construídas sobre o processo de escravidão no Brasil. Sendo um dos temas mais debatidos sobre a História do Brasil. Mas de qualquer maneira a obra de Giberto Freyre foi mais significativa, tanto é que em muitos discursos, como dos personagens citados anteriormente, tem ligações com algumas ideias do autor, como a amenidade no sistema de escravidão no Brasil.

O ensino de História bebeu, por muito tempo, desta obra para a construção dos debates no espaço escolar. Especialmente no que tange a construção da ideia de escravidão e da mesma maneira a ideia de nação, como dito anteriormente é fundamental para o desenvolvimento de um nação, ou manutenção da mesma, que não haja conflitos entre os grupos presentes na sociedade, da mesma maneira que é fundamental expor aos discentes que não houve disputas entre estes grupos no passado, especialmente no que toca assuntos deveras delicado a qualquer sociedade, como a escravidão.

Conclusão

As narrativas escolares são subsídios para a sociedade construir seus discursos, uma vez que boa parte dessas pessoas não continuarão realizando pesquisas e leituras sobre os diversos temas que virão na sala de aula. Os assuntos trabalhos no ensino de história é um exemplo disso tudo, o que é mostrada nesta disciplina é levada quase sempre como verdade, onde dificilmente deixará de existir como verdade para tal aluno, o mesmo reproduzirá e defenderá tal verdade diante de outros que se posicionem contrários.

Obviamente, as narrativas presentes no espaço escolar são frutos de intensas disputas por grupos que desejam a manutenção de sua influência na escola, consequentemente de suas ideias, da mesma maneira que outros grupos anseiam para estarem também nos debates construídos no espaço escolar. Muitas vezes essas narrativas são introduzidas na sociedade de tal maneira que dificilmente são quebradas por outras narrativas.

Qualquer narrativa possui um objetivo, como uma peça de teatro que tenta passar uma mensagem aos espectadores, o espaço escolar torna-se o principal referencial para as pessoas proferirem suas falas em seus pares e sobre os demais grupos. As narrativas no espaço escolar também têm o objetivo de construir as características desejadas para a sociedade, são pensadas cuidadosamente para que façam sentido aos que escutam e estão assistindo, e aceitas pelo restante do grupo.

A fala do procurador do MPPA, e dos demais expostos aqui, são uma evidencia do que foi afirmado neste texto. A ideia sobre as sociedades indígenas e africanas são tecidas há tempos, mas que, apesar de haver uma bibliografia tão vasta sobre o assunto, ainda são proferidas de cunho pejorativo. Essas ideias foram ensinadas no espaço escolar, principalmente no ensino de história que por muito tempo criou-se a ideia de uma harmonia entre os diversos grupos da sociedade brasileira, de uma “democracia racial”.

Como consequência, qualquer tentativa de reparação sobre este período é rechaçada por estes grupos que acreditam que não houve violência abrupta no processo de escravidão, que sempre existiu a harmonia entre estes grupos e que não existe racismo no Brasil pela ideia de que a sociedade é miscigenada. As cotas raciais, uma forma de reparar a “dívida histórica” é constantemente criticada por estes grupos, uma vez que “não há necessidade de reparar algo que não existe”.

Tudo isso é uma forma de tentar manter a tal “harmonia” entre os diversos grupos existentes na sociedade brasileira. Negam a violência no processo de escravidão e negam o racismo, espalham discursos em prol da manutenção da ideia do que foi ensinado no espaço escolar. Revoltam-se contra outras narrativas que tentem mudar esta característica já posta na sociedade brasileira.

Para quebrar estas ideias é fundamental que o ensino de história faça valer os debates sobre as sociedades indígenas e africanas, já previstas em lei, que consigam quebrar cotidianamente estas ideias na sociedade brasileira. O ensino de história tem de ser combativo contra estas narrativas que são proferidas e desqualificam diversos grupos presentes. O ensino de história tem um grande potencial para quebrar estes discursos, apesar de haver grande pressão sob o espaço escolar, é possível quebrar estes discursos pejorativos na sociedade brasileira.

REFERENCIAS

*Athos Matheus da Silva Guimarães é discente do curso de História do campus da Universidade Federal do Pará (UFPA) em Ananindeua. Membro do grupo Ananins desde o ano de 2016. Bolsista pibic/cnpq desde 2017 tratando sobre o ensino de história, memórias e identidades. Atualmente é bolsista pibic/cnpq desenvolvendo pesquisa sobre a construção do agrário nos livros didáticos, sob orientação do professor doutor Francivaldo Alves Nunes (UFPA). E-mail para contato: athosguimaraes26@gmail.com

BITTENCOURT, Circe. Identidade Nacional e Ensino de História do Brasil. In. KARNAL, Leandro (org). História na sala de aula. São Paulo: Editora contexto, 2013. p. 185 – 205.
BITTENCOURT, Circe. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2011.
DAVIS, Nicholas. As camadas populares nos livros didáticos de História do Brasil. In: PINSKY, Jaime (org). O Ensino de História e a construção do fato. São Paulo: Editora Contexto, 2014. p. 121 – 139.
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JANOTTI, Maria de Lourdes Monaco. História, política e ensino de história. In: BITTENCOURT, Circe (org). O saber histórico na sala de aula. São Paulo: Editora Contexto, 2013. p. 42 – 54.
O Liberal. Procurador de Justiça do Pará diz que 'problema da escravidão no Brasil foi porque índio não gosta de trabalhar'. Disponível em: https://g1.globo.com/pa/para/noticia/2019/11/26/procurador-de-justica-do-para-diz-que-problema-da-escravidao-no-brasil-foi-porque-indio-nao-gosta-de-trabalhar.ghtml Acesso em: 13/12/2019

PINSKY, Jaime. Nação e ensino de história no Brasil. In: ______ (org). O Ensino de História e a criação do fato. São Paulo: Editora Contexto, 2014. p. 11 – 27.
QUEIRÓZ, Suely Robles Reis de. Escravidão Negra em debate. In: FREITAS, Marcos Cezar de (org). Historiografia brasileira em perspectiva. São Paulo: Editora Contexto, 2007. p. 103- 119.

Comentários

  1. Muito válido trazer esse debate a partir da fala do desembargador. Muito bem atento para algo que foi deixado de lado: ele aprendeu isso na escola com a disciplina de História. Por conta disso se faz essencial pensarmos sobre as narrativas da História apresentadas no ensino.

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