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Festas de Natal em cidades do Pará no século XIX (1856-1868)

 Texto por:

Wendell P. Machado Cordovil

Festas de Natal século XIX - Grupo Ananins

Na noite da véspera de Natal de 1868, o Secretario de Governo da Província do Pará brindava à amizade do Major Antônio de Miranda e a boa recepção em sua casa para a comemoração do “maior facto christão”. A festa, que contou com convidados significativos na política regional, ocorreu “no importante estabelecimento rural” do Major no “Cairary” (Cairari – Pará). Os convidados foram muito bem recebidos pelo Major e sua esposa, tanto que não sabiam se admiravam mais a recepção ou a abundância, “qualidade, e delicadesa dos manjares”. Não conseguimos saber exatamente os itens que foram parte da Ceia de Natal do Major Miranda, mas podemos imaginar que com seus ilustres convidados deve ter recorrido a compra de alguns itens importados. A historiadora Sidiana de Macêdo comenta sobre a presença desses itens na região em período natalino, como “frutas” que “constituíam um artigo de luxo sendo inclusive um tipo de mimo que poderiam ser presenteados nas festas de Natal” (MACÊDO, 2009, p. 142).

Mas o Natal era diferente para outros sujeitos históricos com menor, ou nenhum, poder aquisitivo. Na própria festa do Major é possível atentar para algumas dessas pessoas. Em determinado momento da celebração “Miranda e sua estimavel Senhora” executaram um “acto humanitario”. O ato se tratou da libertação de uma “linda creança do sexo feminino, sua escrava”. A criança teria ainda sido “baptisada no dia de Natal”. Os padrinhos do batismo foram, também convidados da festa, o Comandante das Armas, General Pinto, e sua filha. Presentes para escravizados eram comuns no século XIX, mas objetos de pequeno valor ou alguma quantia em dinheiro (IANSEN, 2011). Realizar a libertação de um escravizado na véspera de Natal seria então uma situação significativa no período, que ajudaria na construção de uma imagem humanitária.

Outras pessoas pobres também dependiam de atitudes daqueles que possuíssem um pouco mais a doar. Gesto como o dos açougueiros “Penna & Filhos”, que no domingo do dia 25 de dezembro de 1859, iriam distribuir “2 bois d’esmolas aos pobres, que apresentarem a senha dos respectivos parochos”. Observa-se a tentativa de organizar a obra de caridade, deixando anteriormente senhas que deveriam ser distribuídas pelos párocos. Porém, não eram todas as confusões que conseguiam conter no Natal. Como no ocorrido na “noute de Natal” de 1859 em Mocajuba. Naquela noite, “como é de costume”, saíram “a gentalha a dançar e cantar pelas ruas ao son dos adufes e outros instrumentos rusticos”. Quando chegaram até um botequim que pertencia ao “inspector de quarteirão” pediram para entrar. Tiveram a autorização de entrar e lá divertiram o público. Em determinado momento o dono do local tentou entrar para “agradecer o obsequio do cantico”, mas foi impedido “pela patrulha”. Possivelmente um mal entendido, mas que com a insistência do dono em entrar a patrulha “metteo-lhe a chibata”. O homem que deveria “proceder contra os desordeiros” teria sido o primeiro a “mostrar o caminho da discordia”.

Diferente do que se contou sobre o Natal de 1860 no Acará, o qual a “festa de Natal” foi “como nunca, concorrida e brilhante”. Na tarde do dia 24 de dezembro a população acompanhou a benção do novo sino da Igreja matriz, oferecido por alguns ilustres tenentes da região. Na ocasião foi oferecido aos presentes “um primoroso cópo d’água”. Pela noite, fiéis acompanharam a “procissão do menino Deos”, na qual se fez presente uma banda musical. Mas após algumas festas natalinas o que se via não era de alegrar. É o que se observou após a “Festa do Natal de Melgaço”, que no ano de 1856 foi “maior que os passados”. Uma epidemia se alastrou por Melgaço, matando “48 victimas, quazi todos tapuios”. No período natalino, esses supostamente se entregariam ao abuso de “bebidas espirituosas”. Com o fim das festas e saída dos visitantes a epidemia diminuiu, mas apareceu em outras regiões em “pessoas, que a Melgaço tinhão ido”. No entanto, mesmo com as doenças tão comuns no século XIX, muitos conseguiam festejar. Algumas casas inclusive ficavam famosas por suas festas “no tempo do Natal e dos Reis”, como uma em Belém localizada na “travessa das Mercês”. Na casa em período de Natal se realizavam “festas […] em que dançam as pastorinhas, e se fazem diversas representações dramaticas, tragicas e até romanticas”, isso era possível porque na casa “ha um theatrinho no fundo do quintal”.

Mesmo com as dificuldades, os diversos sujeitos da sociedade paraense do século XIX conseguiam festejar em maior ou menor grau as festas do fim de ano.

Referências:
IANSEN, Marta. A celebração do Natal no Brasil do século XIX. História & Outras Histórias. Disponível em: https://martaiansen.blogspot.com/2011/12/celebracao-do-natal-no-brasil-do-seculo.html.
MACÊDO, Sidiana da Consolação Ferreira de. Daquilo que se come: uma história do abastecimento e da alimentação em Belém (1850-1900). UFPA: Dissertação (Mestrado História). 2009.

Fontes:
Diário do Pará (Belém-PA). Viagem, ano I, n 120, 31 de dez. de 1868, p. 1.
A Epocha (Belém-PA). Avizos diversos, ano II, n. 289, 24 de dez. de 1859, p. 2.
A Epocha (Belém-PA). Interior, ano I, n. 23, 29 de jan. de 1859, p. 2.
Gazeta Oficcial (Belém-PA). Correspondencia, Acará 25 de janeiro de 1860, ano III, n. 26, 1 de fev. de 1860, p. 1-2.
Treze de Maio (Belém-PA). Parte Official, ano. XVI, n. 644, 23 de jan. de 1856, p. 2.
A Epocha (Belém-PA). Revista semanal, ano II, n. 74, 4 de abril de 1859, p. 2.

Recorte de jornal na imagem:
O Liberal do Pará (Belém-PA). Artigos próprios para o Natal, ano. XI, n. 292, 24 de dez. de 1879, p. 3.

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