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Desordeiros, palavrões, desastre e mortes nos trilhos da parada de Ananindeua (1894-1897)

 Texto de:

Wendell P. Machado Cordovil*


Jornal Diário de Notícias (PA). 5 de março de 1896, p. 1.


A Estrada de Ferro de Bragança teve o início de suas construções no ano de 1883 e já em 1884 ativou o seu primeiro trecho, de São Braz a Benevides. As viagens eram realizadas com pequenas pausas para embarque e desembarque de passageiros e uma dessas paradas era em Ananindeua, mais aproximadamente na região que atualmente é o quilômetro 9 da BR-316. Ainda longe de ser município, Ananindeua já demonstrava possuir população que construía história no local.

Comumente chamado de “logar Ananindeua”, “logar de nome Ananindeua” ou apenas “Ananindeua”, recebia o trem da Estrada de Ferro, entre 1894 e 1897, às 7h35 da manhã e 5h da tarde. A parada era de apenas cinco minutos. Quem quisesse descer ou subir não tinha muito tempo para gastar no processo. Deveria ser feito rápido. Mas não eram apenas os embarques e desembarques que agitavam a estação de Ananindeua.



Jornal Diário de Notícias (PA). 23 de agosto de 1896, p. 3.


Espadas e navalhas dançavam no ar, empunhadas por pai, Ignácio Thomaz d’Andrade, e filho, Bernardo de tal, que acreditavam serem os únicos donos de terras próximas aos rios “Maguari-açu e Mocaja-tuba”. No entanto, o jornal Diário de notícias de 5 de março de 1896 afirmava que as terras eram dos descendentes das “carafuzas”(variação de “cafuzas”, que seriam descendentes de indígenas e negros) Domingas Maria e Maria Manoel. Mas Ignácio d’Andrade, segundo o mesmo jornal, estava empenhado em deslegitimar o direito dos descendentes das duas mulheres, e para isso não se preocupava em utilizar o “poderio que lhe dá o cargo de chefe da estação do Ananindeua, lugar onde estão situadas as ditas terras”. O empenho de Ignácio era tanto que partiu para a violência física. Juntamente com dois de seus filhos, Luiz e Bernado, e mais alguns de seus trabalhadores “que moram em frente a estação” partiram para atacar o filho do sr. Lourenço Justiniano dos Santos enquanto esperava o trem da tarde. Segundo o jornal, o filho de Lourenço seria “victimado” se não fosse a atuação de várias pessoas. Ignácio era acusado de “capangagem” e a manchete alertava “Desordens no Ananindeua”.

Outro funcionário da estação de Ananindeua que se envolveu em problemas foi o “estacionário”, funcionário responsável pelo controle na parada e do prosseguimento do trem. O estacionário de Ananindeua se envolveu em uma confusão com o “ex redactor em chefe” do jornal Diário de Notícias logo “na véspera da festa de Nazareth” do ano de 1897. Vendeu bilhetes a mais e o trem não teria capacidade de levar todos os passageiros, por conta disso o trem não pararia. O ex redator, “dr. Filippe Lima”, havia comprado bilhete para si e para uma criança de 9 anos a qual provavelmente levaria para a cidade. Precisava chegar urgentemente até Belém ou entrar em contato com pessoas lá para resolver um importante negócio. Pediu então ao estacionário para usar o “telephone”. Foi atendido com “palavrões indecentes” e impedido de utilizar o aparelho. “Cumpro ordens” teria dito o estacionário antes de dizer outro palavrão. Quando o maquinista percebeu o grande número de passageiros começou a parar o trem. No entanto, o estacionário impediu e o mandou seguir. Foi nesse momento que Filippe Lima conseguiu pular para dentro do trem. O menino de 9 anos ficou, acompanhado da família que também estava na estação. Depois de o trem não parar, várias pessoas foram reclamar pedindo o dinheiro das passagens de volta. Provavelmente ouviram os mesmos palavrões do estacionário. 

Desastres também foram vistos nos trilhos da parada de Ananindeua. O Diário de Notícias de 3 de janeiro de 1894, anunciava o “Desastre”. Todos suspeitavam que Antonio Gonçalves de Souza estava bêbado. Os sinais avisando que o trem estava próximo se repetiam e o sujeito apenas ignorava, ou nem os escutava por conta de estar “embriagado”. Já era tarde demais quando o maquinista Joaquim de Oliveira tentou parar o trem. Viu que havia um homem correndo perigo nos trilhos. Era impossível parar aquela máquina a vapor. O que se resultou foi uma cena aterrorizante: “Gonçalves esmagado pelo trem, que cortou-o em pedaços”. Segundo o jornal, seu sepultamento ocorreu em Benevides.

Outro caso de “Esmagamento”, como aparecia na manchete, ocorreu em 1896. O jornal Diário de Notícias de 19 de novembro de 1896 afirmava que o subprefeito de Ananindeua teria sido o responsável por encontrar o corpo de Izidoro de tal no trilho da Estrada de Ferro. Izidoro seria “brequista”, possivelmente cumprindo as mesmas funções do estacionário, da parada de Ananindeua. Seu corpo foi encontrado às 3h da madrugada pelo subprefeito no dia 18 de novembro daquele ano, dia anterior à publicação no jornal.

A movimentação em Ananindeua acontecia com a chegada e partida do trem, mas as fontes deixam claro que já existia muita vida na região para além dos vagões dos trens. Algumas mortes, e ameaças contra a vida, também ocorriam, exibindo um histórico de violência mais longo do que se pensava na região que se tornaria o atual município de Ananindeua.

Referências:

Quando o trem passou por aqui. Disponível em:

https://rotaturisticabelembraganca.wordpress.com/. Acesso em 30 de abril de 2021.


Fontes: 


Jornal - Diário de Notícias (PA). 3 de janeiro de 1894, p.

Jornal - Diário de Notícias (PA). de 3 de janeiro de 1894, p. 1.

Jornal -Diário de Notícias (PA). 19 de dezembro de 1896, p. 2.

Jornal - Diário de Notícias (PA). 23 de agosto de 1896, p. 3.

Jornal - Diário de Notícias (PA). 5 de março de 1896, p. 2.

Jornal Diário de Notícias. 20 de outubro de 1897, p. 1.


*Wendell P. Machado Cordovil é Graduando de Licenciatura em História pela UFPA (Ananindeua). Membro do Grupo Ananins, do Grupo de Pesquisa História e Natureza (GRHIN) e do Grupo de Pesquisa de História do Abastecimento e da Alimentação na Amazônia - Alere.

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