BREVES REFLEXÕES TEMPORAIS NA PROVA DO CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA: PROBLEMATIZAR E PENSAR O TEMPO
Texto de
Eliandra Gleyce Dos Passos Rodrigues.
Dialogar sobre o
que é o tempo, é algo complexo e abstrato, porém não é inerente ao homem visto
que o tempo tal como o conhecemos, é algo fruto da nossa sociedade para a nossa
compreensão de nós situarmos e relacionarmos no meio social e assim mostra-se relevante
para a nossa própria organização, isto é, a forma matemática da divisão de :
manhã, tarde e noite; em âmbitos mais amplos, e também tendo nestes como os
nossos marcadores temporais para definirmos o que é o “dia” “ano” e “noite” bem
como entendermos a colocação de horas minutos e segundos, isto é, estão bem
estruturados em um espaço do qual a gente se orienta : o calendário e o relógio.
A persistência da memória - Salvador Dali (1931) |
No
geral o calendário e o relógio é a medição que conhecemos bem em nosso
cotidiano, pois desde quando éramos crianças estiveram ali em nosso dia-a-dia,
embora tivéssemos em mente que são frutos da construção humana para
organização, ela não é universalmente verdadeira e iguais para todos, ao observamos a
natureza e principalmente os animais percebemos que eles não necessitam de um
calendário, relógio e tão pouco estão preocupados com isso, porém quanto a nós, isso toma uma proporção enorme porque as relações humanas e as ações da sociedade se
dão em um espaço físico em um determinado tempo, e desta maneira, refletir e se
preocupar com tempo não se encontra só nos debates acadêmicos, pois extrapola
os muros da Universidade visto que é algo que instiga e impulsionam nós, homens
e mulheres a buscar, e se situar no mundo. O fato de sermos seres pensantes e
filosóficos, sua significação é abertura para os historiadores porque para
Peres (2017: p. 42) isto é também significado visto que “a História e o
historiador tem relação com o chamado “tempo calendário” , porém para essa
ciência o que se passa nos meandros das datas é mais importante de que elas
mesmas. Logo o historiador não se furta a utilizar-se [....].”
Sendo
assim o tempo não somente é objeto de estudo e pesquisas de físicos,
astrônomos, matemáticos e etc., como também seguem instigando a própria classe
de historiadores, porque para Scaldaferri (2008: p. 53) “ a noção do tempo
social, aquele que as sociedades humanas imprimem à época em que vivem,
relacionando com o seu passado e o seu futuro, um tempo de simultaneidade
mudanças e permaneças.” Desta forma conhecer o tempo engloba diversas áreas,
além de nós permitir quebrar com aquilo que os estudos de Barros ( 2006: p. 461)
, nós aponta, os paradigmas que se tem sobre o que é história e que “História deve examinar apenas e
necessariamente o Passado.” quando na verdade se busca configurar as ações, as
permanências, as consequências, e os
efeitos dentro de um recorte de tempo, ou recorte temporal.
Noções
de tempo e suas temporalidades e importância para o ensino e pesquisa em
história.
A escola dos Annales nesse quesito ganha
espaço para o estatuto da História com seus fundadores e influências da
primeira a quarta geração, principalmente porque eles trazem a questão das
múltiplas fontes e a interdisciplinaridade para maior compreensão dentro dos
estudos históricos, pois “Definir a história como o estudo do homem no tempo
foi portanto um passo decisivo para a expansão dos domínios
historiográficos” (BARROS, 2006: p. 463). Até porque os Annales em contraposição
a ''escola metódica e tradicional'' não enxergava o tempo como linear e de
progressão tão pouco aquela história que se volta ao passado a fim de ser a
“mestre da vida” exemplar ou espelho, mas é no dialogo interdisciplinar, com várias fontes além dos documentos oficiais bem como o estudo do
presente/passado e sua dialética, os estudos para âmbito de pesquisa histórica
ganham maior visibilidade.
Embora
para Peres, cita que trabalhar com “a ideia de tempo humano sugere, considerar
a sensibilidade humana e experiências individuais” (PERES, 2017: p.42). O mesmo se aplica ao espaço da linha de ensino
de História e da disciplina escolar em sala de aula, pois se para o próprio
historiador enquanto pesquisador é necessário um trabalho fixo e cuidadoso com
o recorte temporal, a seleção da fonte e a própria preocupação com o tratamento
da fonte e o lugar das falas, porque estas pesquisas se voltarão para o ensino
, seja presente nos livros didáticos ou paradidáticos, mesmo que estes sejam
mais suprimidos ou resumidos devido o publico alvo a ser atingido ou no
material didático que professor elabora e referencia; as apostilas , é neste
sentido que se tem preocupação do que se pesquisa e o que se tem pesquisado
pois os estudos históricos chegarão ao livro, ou na sala de aula, seja por meio
de ferramentas e metodologias usadas pelos professores ou nas próprias
pesquisas que os alunos fazem.
E se em níveis acadêmicos o debate é profundo
e complexo necessitando de uma boa carga de leitura sobre teoria da história, o
cuidado é minucioso ao refletir no ensino, seja no fundamental maior como no
médio e as modalidades EJA e áreas técnicas de conhecimento, isto é o nível
profissional técnico. E muito mais se deve ter cuidado quando o assunto são crianças e pré-adolescentes, por saber e valorizar o que eles já possuem de
conhecimento histórico e lapidá-los em sala de aula, como por exemplo, a BNCC
trabalha no 6ª ano a questão de ‘noções de tempo’ para inicio de aula o
professor poderia usar, por exemplo, os álbuns de fotos pessoais dos alunos ou
documentos de familiares para mostrar a eles como o conhecimento histórico é
produzido, que provem de fontes, sejam elas documentais, orais, e outras
diversas.
Outra preocupação que se tem no ensino é a da
construção e no desenvolvimento da criança por que:
O conceito de tempo só será construído
pela criança, progressivamente, em várias etapas do seu desenvolvimento, ela é
capaz de distinguir o dia e a noite, sequenciar etapas de um acontecimento,
apontar o antes e o depois pela percepção do tempo vivido, mas seguir o tempo
vivê-lo não é compreendê-lo.
(SCALDAFERRI,
2008: p.55. )
Isto é, a criança e os adolescentes devem
ser levados em conta segundo seus aspectos pessoais, cognitivos e de
desenvolvimento de compreensão conforme sua idade, porque se o professor acabar
exigindo do aluno além daquilo que ele pode fazer ou até mesmo sem levar em
consideração fatores externos e internos, ele pode acabar por não conseguir ter
um ensino efetivo da disciplina de história, por não conseguir colocar em
pratica aquilo que ele dispõe como conteúdos em sala, visto que são muitas as
diversidades, e problemas a serem vencidos, bem como a própria questão de
compreensão das temporalidades, séculos, o lugar em que o acontecimento se deu,
como ele desencadeou, o que ele resultou, no que ele efetivou no cenário local,
regional, internacional, o que foi eleito e posto como verossimilhanças bem
como os aparatos ideológicos envolvidos.
A
formação de professores de história na licenciatura também deve ser continua por
isso o professor sempre ou quase sempre será um eterno e profundo pesquisador,
não somente para atualizar o conhecimento em sala de aula no que os alunos
demandam como bem na aquisição e renovação de novas ou próprias
metodologias de ensino e pesquisa histórica.
A
construção textual e as noções de tempo para a argumentação que é proposta por
quem escreve.
Na
história quando se escreve, geralmente muitas coisas estão envolvidas tais como
o objetivo, a instigação, as influencias do tempo e principalmente a quem e
para quem se escreve, no âmbito acadêmico, nós valemos do método, para colocar
as pesquisas desenvolvidas dentro da corrente dos estudos históricos
situando-os na historiografia com suas respectivas contribuições.
Ao analisarmos, por exemplo, o artigo
escrito por Fernandes e Barbosa [1] (
2011) percebermos como os autores colocam seus estudos estruturados em três obras
a fim de se equipar e embasar sua escrita e fala para desenvolver a construção
pautada na memoria e da figura de Porfirio Diaz, do qual os autores Fernandes e
Barbosa, tentam explicar como a trajetória se liga ou se articulou ao México, isto é, como a imagem
de um politico se basa e se articula a uma memoria nacional que se perpetua
ainda hoje.
Para
a composição de seu artigo, eles fazem a seleção de três autores sendo eles,
dois partícipes e contemporâneos de Porfirio Diaz: Bernardo Reys que fora
militar e apoiador do grupo liberal, atuando também como soldado da guerra contra
a intervenção francesa, e que durante o período da presidência de Porfirio Diaz
assumiu cargos e foi nomeado Ministro de Guerra; e Justo Sierra que era membro
da camada elitista porfirista; apoiou as propagandas de reeleições do
presidente membro da ULN, escreveu obras da qual também criticava certas
posturas do presidente, do qual Fernandes e Barbosa compreende o ensaio de “la
era actual” que sofreu uma edição no México a chamada sua evolução para Mexico
social e politico na década de quarenta, dos qual os autores , se vale dessa
edição , mas por que e de que sentido ? Porque Fernandes e Barbosa ao usar
como fonte essa obra de Sierra, mostra-nos como a imagem é construída por se
valer de um passado que justificaria aos 30 anos de poder, que suavizaria o
termo ditadura como aquele memoria construída de aquele que traria a paz ao
México, por meio dessa obra de Sierra reeditada, isto nós faz raciocinar como a
própria linguagem e conceito atribuído dentro de um contexto toma
ressignificação e releitura diversa que nos permite moldar esse passado, moldar
no sentido que exponho aqui, é de romper com a ideia de um passado histórico
estático e verídico, quando meditamos e olhamos tais fontes; outra obra, a
terceira e ultima cujo qual os autores tomam como objeto e a do jornalista que
toma a ascensão após a saída de Porfirio, no caso Madero, em que publica
trabalhos de criticas ao governo porfirista, para ele colocando como que :
ditadura, claramente em contraposição a imagem de justificação de poder que
Reys e Sierra pressupõe a fazer de
Porfirio Diaz, Fernandes e Assis ao trabalhar a obra de Madero, coloca
também como ainda que oposto ao governo, reafirma e reconhece essa figura
trabalhada no meio como aquele que é ditador só que, é um ditador bom, e que
trouxe mudanças significativas. Assim dentro de analises de temporalidades
diferentes transitórias de XIX para XX os autores propõe discutir em quais
aspectos continua-se a pacificar o passado e como a obra de Madero muda o curso
da discursiva de Porfirio, e que mesmo assim a imagética construída se
justifica para a Revolução Mexicana como a historia pautada nos grandes efeitos
e “espelho” ou “mestre da vida”.
É
dentro destes estudos que os autores mencionam como se usa o passado, o
presente e o futuro e suas incertezas como construção de uma memoria coletiva,
nas duas obras de seus aliados Reys e Sierra vão falar de um passado caótico
que Porfirio consegue reestruturar e de um futuro salvador em sua imagem, e
Madero posteriormente dialoga com este “passado” assim se atribui e resulta nas
equivocações e na revolução mexicana bem como as demais crises apesar de se
reconhecer a forte imagem de Porfirio principalmente em seleção aos mexicanos.
Percebemos aqui a importância da narrativa
para a argumentação dos autores e do uso das fontes para seus estudos
comparativos mediante o método , dentro de um recorte de tempo, tempo este que
segundo Guimarães (2007) é visível e invisível aos historiadores, que é
trabalhado e mencionado pelos historiadores, em que sentido ? ao raciocinarmos
que o passado não é objeto e quebrar os preconceitos que na história “tudo é
passado” ou que a história só fala ou trata de passado, situamos aqui a
problemática envolvida, pois o objetivo da história não é meramente um passado
muito do qual tão pouco vivemos e conhecemos, porém por meio do invisível ver
aquilo que é visível, sem tão pouco atribuir-lhes tanto do nosso tempo a um
passado que não vivenciamos, para isso é preciso olhar as fontes criticamente ,
verificar quais as concepções envolvidas, e historicizar o próprio historiador ou autor que está incluso em um
espaço e tempo, coisa que Fernandes e Barbosa (2011) situa bem como entender a
influencia historiográfica envolvida, aqui ao verificarmos o artigo dos
autores, percebemos a preocupação que eles tem de por e levar em consideração o
lugar de fala de Reys e Sierra e Madero, bem como sua posição social, e os
objetivos deles em relação ao tratamento da figurativa do período de
porfiriato, obras essas que divergem mas que se denota importância dentro do
que Fernandes e Barbosa (2011) propõe , que é este armazenamento do passado,
rupturas e progresso de como é colocado dentro da historiografia, levando-se em
conta as particularidades, e da teoria da história, como elemento justificador
de narrativas para o passado e presentes dentro de uma experiência social.
Para Guimarães (2007: p.12) “refletir acerca
dessa complexa relação entre o visível e o invisível, que este na raiz mesma do
trabalho do historiador” parecem está dentro do que ele conclui como uma
obsessão de arquivamentos do passado, é preciso arquivar é preciso escrever,
colecionar e não esquecer, porem segundo Assis (2010) o autor reconhece que “a
experiência do Passado não é intrinsecamente histórica, mas torna-se
historica”, isto é, o passado historia é atribuído as experiências devido as
suas propriedades de historicidade, isto acontece quando ele usa-se da teoria
da historia do Rüsen e verifica como a estrutura da obra de Sergio Buarque de
Holanda, não menciona a “crise do Império a Republica” como objetivo histórico
, porém apresenta muito mais o seu tempo em que foi escrito , durante a ditadura
civil militar, é por isso que tal obra de Sergio Buarque de Holanda, é
estudada, questionada, por uns como anacronismo excessivo e outros estudos
históricos que suavizam que ele por está escrevendo em um período especifico ,
não necessariamente é historia porém, se propõe como objeto histórico dentro das
fases interpretativas que se coloca também em Fernandes e Barbosa para a
questão das três fontes usadas.
A
guisa conclusiva, observamos como tais noções de tempo e temporalidades não
somente devem ser levadas a seriedade para o oficio do historiador como que
cuidados extras com ele é repassado principalmente em sala de aula, pois
mostra as suas potencialidades ou expõe o que a história é enquanto “caos”, a
própria seleção e recortes de tempo se dá tanto no âmbito acadêmico para
introduzi-lo como já vimos na corrente de estudos historiográficos como também
na própria colocação oral e em postura em sala de aula.
[1] Artigo pacificar a história: passado, presente e futuro nas formas de pensar a politica mexicana, pautadas na imagética de Porfirio Diaz, publicado pela Revista história da historiografia de 2011.
Referencias
ASSIS, A. Teoria da historia como hermenêutica da
historiografia: uma interpretação de do Imperio á Republica de Sergio Buarque
de Holanda. Revista Brasileira de História, São Paulo, v 30, nº 59, 2010.
P. 91-120.
BARROS, J. D.A. Historia, Espaço e Tempo Interações
necessárias. Varia Historia, Belo Horizonte, v 22, nº 36, julh/dez 2006. P.
460-476.
FERNANDES, L.E.O.
BARBOSA, F.B. Pacificar a historia:
passado, presente, e futuro nas formas de pensar a politica mexicana na
transição do século XIX ao XX. Revista historia da historiografia, Ouro
Preto, nº7, nov/dez 2011. P. 134- 156.
GUIMARÃES , M.L.S. Vendo o passado representação e escrita da
história. Anais do museu paulista. São Paulo, v.15, nº 2, julh/dez 2007. P.
11-30
PERES, M.V.M. O tempo histórico em perspectiva: a
importância do debate sobre o tempo para o ensino de história. Revista EBR,
v.2, n º2, 2017, p. 38-57
SCALDAFERRI, D.C.M. Concepções de tempo e ensino de história.
Revista historia e ensino, Londrina, Paraná, v.14, agosto 2008. P.53-69.
BNCC – Base nacional
comum curricular
EJA – Educação de
jovens e adultos
UNL – União liberal
nacional
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